segunda-feira, 6 de abril de 2015


As 18 Razões CONTRA a Redução da Maioridade Penal 1°. Porque já responsabilizamos adolescentes em ato infracional A partir dos 12 anos, qualquer adolescente é responsabilizado pelo ato cometido contra a lei. Essa responsabilização, executada por meio de medidas socioeducativas previstas no ECA, têm o objetivo de ajudá-lo a recomeçar e a prepará-lo para uma vida adulta de acordo com o socialmente estabelecido. É parte do seu processo de aprendizagem que ele não volte a repetir o ato infracional. Por isso, não devemos confundir impunidade com imputabilidade. A imputabilidade, segundo o Código Penal, é a capacidade da pessoa entender que o fato é ilícito e agir de acordo com esse entendimento, fundamentando em sua maturidade psíquica. 2°. Porque a lei já existe. Resta ser cumprida! O ECA prevê seis medidas educativas: advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, semiliberdade e internação. Recomenda que a medida seja aplicada de acordo com a capacidade de cumpri-la, as circunstâncias do fato e a gravidade da infração. Muitos adolescentes, que são privados de sua liberdade, não ficam em instituições preparadas para sua reeducação, reproduzindo o ambiente de uma prisão comum. E mais: o adolescente pode ficar até 9 anos em medidas socioeducativas, sendo três anos interno, três em semiliberdade e três em liberdade assistida, com o Estado acompanhando e ajudando a se reinserir na sociedade. Não adianta só endurecer as leis se o próprio Estado não as cumpre! 3°. Porque o índice de reincidência nas prisões é de 70% Não há dados que comprovem que o rebaixamento da idade penal reduz os índices de criminalidade juvenil. Ao contrário, o ingresso antecipado no falido sistema penal brasileiro expõe as(os) adolescentes a mecanismos/comportamentos reprodutores da violência, como o aumento das chances de reincidência, uma vez que as taxas nas penitenciárias são de 70% enquanto no sistema socioeducativo estão abaixo de 20%. A violência não será solucionada com a culpabilização e punição, mas pela ação da sociedade e governos nas instâncias psíquicas, sociais, políticas e econômicas que as reproduzem. Agir punindo e sem se preocupar em discutir quais os reais motivos que reproduzem e mantém a violência, só gera mais violência. 4°. Porque o sistema prisional brasileiro não suporta mais pessoas. O Brasil tem a 4° maior população carcerária do mundo e um sistema prisional superlotado com 500 mil presos. Só fica atrás em número de presos para os Estados Unidos (2,2 milhões), China (1,6 milhões) e Rússia (740 mil). O sistema penitenciário brasileiro NÃO tem cumprido sua função social de controle, reinserção e reeducação dos agentes da violência. Ao contrário, tem demonstrado ser uma “escola do crime”. Portanto, nenhum tipo de experiência na cadeia pode contribuir com o processo de reeducação e reintegração dos jovens na sociedade. 5°. Porque reduzir a maioridade penal não reduz a violência. Muitos estudos no campo da criminologia e das ciências sociais têm demonstrado que NÃO HÁ RELAÇÃO direta de causalidade entre a adoção de soluções punitivas e repressivas e a diminuição dos índices de violência. No sentido contrário, no entanto, se observa que são as políticas e ações de natureza social que desempenham um papel importante na redução das taxas de criminalidade. Dados do Unicef revelam a experiência mal sucedida dos EUA. O país, que assinou a Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança, aplicou em seus adolescentes, penas previstas para os adultos. Os jovens que cumpriram pena em penitenciárias voltaram a delinquir e de forma mais violenta. O resultado concreto para a sociedade foi o agravamento da violência. 6°. Porque fixar a maioridade penal em 18 anos é tendência mundial Diferentemente do que alguns jornais, revistas ou veículos de comunicação em geral têm divulgado, a idade de responsabilidade penal no Brasil não se encontra em desequilíbrio se comparada à maioria dos países do mundo. De uma lista de 54 países analisados, a maioria deles adota a idade de responsabilidade penal absoluta aos 18 anos de idade, como é o caso brasileiro. Essa fixação majoritária decorre das recomendações internacionais que sugerem a existência de um sistema de justiça especializado para julgar, processar e responsabilizar autores de delitos abaixo dos 18 anos. 7°. Porque a fase de transição justifica o tratamento diferenciado. A Doutrina da Proteção Integral é o que caracteriza o tratamento jurídico dispensado pelo Direito Brasileiro às crianças e adolescentes, cujos fundamentos encontram-se no próprio texto constitucional, em documentos e tratados internacionais e no Estatuto da Criança e do Adolescente. Tal doutrina exige que os direitos humanos de crianças e adolescentes sejam respeitados e garantidos de forma integral e integrada, mediando e operacionalização de políticas de natureza universal, protetiva e socioeducativa. A definição do adolescente como a pessoa entre 12 e 18 anos incompletos implica a incidência de um sistema de justiça especializado para responder a infrações penais quando o autor trata-se de um adolescente. A imposição de medidas socioeducativas e não das penas criminais relaciona-se justamente com a finalidade pedagógica que o sistema deve alcançar, e decorre do reconhecimento da condição peculiar de desenvolvimento na qual se encontra o adolescente. 8°. Porque as leis não podem se pautar na exceção. Até junho de 2011, o Cadastro Nacional de Adolescentes em Conflito com a Lei (CNACL), do Conselho Nacional de Justiça, registrou ocorrências de mais de 90 mil adolescentes. Desses, cerca de 30 mil cumprem medidas socioeducativas. O número, embora seja considerável, corresponde a 0,5% da população jovem do Brasil, que conta com 21 milhões de meninos e meninas entre 12 e 18 anos. Sabemos que os jovens infratores são a minoria, no entanto, é pensando neles que surgem as propostas de redução da idade penal. Cabe lembrar que a exceção nunca pode pautar a definição da política criminal e muito menos a adoção de leis, que devem ser universais e valer para todos. As causas da violência e da desigualdade social não se resolverão com a adoção de leis penais severas. O processo exige que sejam tomadas medidas capazes de romper com a banalização da violência e seu ciclo. Ações no campo da educação, por exemplo, demonstram-se positivas na diminuição da vulnerabilidade de centenas de adolescentes ao crime e à violência. 9°. Porque reduzir a maioridade penal é tratar o efeito, não a causa! A constituição brasileira assegura nos artigos 5º e 6º direitos fundamentais como educação, saúde, moradia, etc. Com muitos desses direitos negados, a probabilidade do envolvimento com o crime aumenta, sobretudo entre os jovens. O adolescente marginalizado não surge ao acaso. Ele é fruto de um estado de injustiça social que gera e agrava a pobreza em que sobrevive grande parte da população. A marginalidade torna-se uma prática moldada pelas condições sociais e históricas em que os homens vivem. O adolescente em conflito com a lei é considerado um ‘sintoma’ social, utilizado como uma forma de eximir a responsabilidade que a sociedade tem nessa construção. Reduzir a maioridade é transferir o problema. Para o Estado é mais fácil prender do que educar. 10°. Porque educar é melhor e mais eficiente do que punir. A educação é fundamental para qualquer indivíduo se tornar um cidadão, mas é realidade que no Brasil muitos jovens pobres são excluídos deste processo. Puni-los com o encarceramento é tirar a chance de se tornarem cidadãos conscientes de direitos e deveres, é assumir a própria incompetência do Estado em lhes assegurar esse direito básico que é a educação. As causas da violência e da desigualdade social não se resolverão com adoção de leis penais mais severas. O processo exige que sejam tomadas medidas capazes de romper com a banalização da violência e seu ciclo. Ações no campo da educação, por exemplo, demonstram-se positivas na diminuição da vulnerabilidade de centenas de adolescentes ao crime e à violência. Precisamos valorizar o jovem, considerá-los como parceiros na caminhada para a construção de uma sociedade melhor. E não como os vilões que estão colocando toda uma nação em risco. 11°. Porque reduzir a maioridade penal isenta o estado do compromisso com a juventude O Brasil não aplicou as políticas necessárias para garantir às crianças, aos adolescentes e jovens o pleno exercício de seus direitos e isso ajudou em muito a aumentar os índices de criminalidade da juventude. O que estamos vendo é uma mudança de um tipo de Estado que deveria garantir direitos para um tipo de Estado Penal que administra a panela de pressão de uma sociedade tão desigual. Deve-se mencionar ainda a ineficiência do Estado para emplacar programas de prevenção da criminalidade e de assistência social eficazes, junto às comunidades mais pobres, além da deficiência generalizada em nosso sistema educacional. 12°. Porque os adolescentes são as maiores vitimas, e não os principais autores da violência Até junho de 2011, cerca de 90 mil adolescentes cometeram atos infracionais. Destes, cerca de 30 mil cumprem medidas socioeducativas. O número, embora considerável, corresponde a 0,5% da população jovem do Brasil que conta com 21 milhões de meninos e meninas entre 12 e 18 anos. Os homicídios de crianças e adolescentes brasileiros cresceram vertiginosamente nas últimas décadas: 346% entre 1980 e 2010. De 1981 a 2010, mais de 176 mil foram mortos e só em 2010, o número foi de 8.686 crianças e adolescentes assassinadas, ou seja, 24 POR DIA! A Organização Mundial de Saúde diz que o Brasil ocupa a 4° posição entre 92 países do mundo analisados em pesquisa. Aqui são 13 homicídios para cada 100 mil crianças e adolescentes; de 50 a 150 vezes maior que países como Inglaterra, Portugal, Espanha, Irlanda, Itália, Egito cujas taxas mal chegam a 0,2 homicídios para a mesma quantidade de crianças e adolescentes. 13°. Porque, na prática, a pec 33/2012 é inviável!! A Proposta de Emenda Constitucional quer alterar os artigos 129 e 228 da Constituição Federal, acrescentando um paragrafo que prevê a possibilidade de desconsiderar da inimputabilidade penal de maiores de 16 anos e menores de 18 anos. E o que isso quer dizer? Que continuarão sendo julgados nas varas Especializadas Criminais da Infância e Juventude, mas se o Ministério Publico quiser poderá pedir para ‘desconsiderar inimputabilidade’, o juiz decidirá se o adolescente tem capacidade para responder por seus delitos. Seriam necessários laudos psicológicos e perícia psiquiátrica diante das infrações: crimes hediondos, tráfico de drogas, tortura e terrorismo ou reincidência na pratica de lesão corporal grave e roubo qualificado. Os laudos atrasariam os processos e congestionariam a rede pública de saúde. A PEC apenas delega ao juiz a responsabilidade de dizer se o adolescente deve ou não ser punido como um adulto. No Brasil, o gargalo da impunidade está na ineficiência da polícia investigativa e na lentidão dos julgamentos. Ao contrário do senso comum, muito divulgado pela mídia, aumentar as penas e para um número cada vez mais abrangente de pessoas não ajuda em nada a diminuir a criminalidade, pois, muitas vezes, elas não chegam a ser aplicadas. 14°. Porque reduzir a maioridade penal não afasta crianças e adolescentes do crime Se reduzida a idade penal, estes serão recrutados cada vez mais cedo. O problema da marginalidade é causado por uma série de fatores. Vivemos em um país onde há má gestão de programas sociais/educacionais, escassez das ações de planejamento familiar, pouca oferta de lazer nas periferias, lentidão de urbanização de favelas, pouco policiamento comunitário, e assim por diante. A redução da maioridade penal não visa a resolver o problema da violência. Apenas fingir que há “justiça”. Um autoengano coletivo quando, na verdade, é apenas uma forma de massacrar quem já é massacrado. Medidas como essa têm caráter de vingança, não de solução dos graves problemas do Brasil que são de fundo econômico, social, político. O debate sobre o aumento das punições a criminosos juvenis envolve um grave problema: a lei do menor esforço. Esta seduz políticos prontos para oferecer soluções fáceis e rápidas diante do clamor popular. Nesse momento, diante de um crime odioso, é mais fácil mandar quebrar o termômetro do que falar em enfrentar com seriedade a infecção que gera a febre. 15°. Porque afronta leis brasileiras e acordos internacionais Vai contra a Constituição Federal Brasileira que reconhece prioridade e proteção especial a crianças e adolescentes. A redução é inconstitucional. Vai contra o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE) de princípios administrativos, políticos e pedagógicos que orientam os programas de medidas socioeducativas. Vai contra a Doutrina da Proteção Integral do Direito Brasileiro que exige que os direitos humanos de crianças e adolescentes sejam respeitados e garantidos de forma integral e integrada às políticas de natureza universal, protetiva e socioeducativa. Vai contra parâmetros internacionais de leis especiais para os casos que envolvem pessoas abaixo dos dezoito anos autoras de infrações penais. Vai contra a Convenção sobre os Direitos da Criança e do Adolescente da Organização das Nações Unidas (ONU) e a Declaração Internacional dos Direitos da Criança compromissos assinados pelo Brasil. 16°. Porque poder votar não tem a ver com ser preso com adultos O voto aos 16 anos é opcional e não obrigatório, direito adquirido pela juventude. O voto não é para a vida toda, e caso o adolescente se arrependa ou se decepcione com sua escolha, ele pode corrigir seu voto nas eleições seguintes. Ele pode votar aos 16, mas não pode ser votado. Nesta idade ele tem maturidade sim para votar, compreender e responsabilizar-se por um ato infracional. Em nosso país qualquer adolescente, a partir dos 12 anos, pode ser responsabilizado pelo cometimento de um ato contra a lei. O tratamento é diferenciado não porque o adolescente não sabe o que está fazendo. Mas pela sua condição especial de pessoa em desenvolvimento e, neste sentido, o objetivo da medida socioeducativa não é fazê-lo sofrer pelos erros que cometeu, e sim prepará-lo para uma vida adulta e ajuda-lo a recomeçar. 17°. Porque o brasil está dentro dos padrões internacionais. São minoria os países que definem o adulto como pessoa menor de 18 anos. Das 57 legislações analisadas pela ONU, 17% adotam idade menor do que 18 anos como critério para a definição legal de adulto. Alemanha e Espanha elevaram recentemente para 18 a idade penal e a primeira criou ainda um sistema especial para julgar os jovens na faixa de 18 a 21 anos. Tomando 55 países de pesquisa da ONU, na média os jovens representam 11,6% do total de infratores, enquanto no Brasil está em torno de 10%. Portanto, o país está dentro dos padrões internacionais e abaixo mesmo do que se deveria esperar. No Japão, eles representam 42,6% e ainda assim a idade penal no país é de 20 anos. Se o Brasil chama a atenção por algum motivo é pela enorme proporção de jovens vítimas de crimes e não pela de infratores. 18°. Porque importantes órgãos têm apontado que não é uma boa solução. O UNICEF expressa sua posição contrária à redução da idade penal, assim como à qualquer alteração desta natureza. Acredita que ela representa um enorme retrocesso no atual estágio de defesa, promoção e garantia dos direitos da criança e do adolescente no Brasil. A Organização dos Estados Americanos (OEA) comprovou que há mais jovens vítimas da criminalidade do que agentes dela. O Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA) defende o debate ampliado para que o Brasil não conduza mudanças em sua legislação sob o impacto dos acontecimentos e das emoções. O CRP (Conselho Regional de Psicologia) lança a campanha Dez Razões da Psicologia contra a Redução da idade penal CNBB, OAB, Fundação Abrinq lamentam publicamente a redução da maioridade penal no país. Mais de 50 entidades brasileiras aderem ao Movimento 18 Razões para a Não redução da maioridade penal.

sábado, 10 de agosto de 2013

A EXPERIENCIA DO CONSELHO DE GESTORES COMUNITÁRIOS DO RIO DE
JANEIRO - CONGESCO-RJ
Vou tratar aqui de uma forma de organização comunitária surgida na década de
90: Conselho de Gestores Comunitários do Rio de Janeiro - CONGESCO-RJ, a partir de
minha convivência e atuação, da observação direta, e documentos consultados. Trata-se
de uma iniciativa de um grupo de lideranças comunitárias que participaram de projetos de
capacitação na linha de desenvolvimento comunitário. Através desse caso, levantam-se
pistas para se pensar em formas novas de participação da população através de espaços
nos quais se encontram atores “de fora” e “de dentro” da favela.
3.1 – Antecedentes: O Projeto de Capacitação de Gestores Comunitários - CGCOs processos aqui tratados surgiram de uma iniciativa da ONG Médicos Sem
Fronteira (MSF), uma organização humanitária internacional, que atua junto a
comunidades de baixa renda no enfrentamento de questões sociais na área da saúde.
Chegou ao Brasil em 1991 para trabalhar no combate a uma epidemia de cólera entre
populações indígenas na Amazônia. Em 1993 veio para o Rio de Janeiro onde trabalhou
com meninos de rua. Em 1994, motivada pela chacina de Vigário Geral, vem para a favela
Parque Proletário de Vigário Geral, onde instala um Posto de Saúde, que posteriormente
passaria a ser administrado pelos próprios moradores. Chegando ao fim do projeto e
estando a ONG MSF prestes a deixar a comunidade, a equipe percebeu que os
moradores ainda não estavam preparados para administrá-lo, percebeu-se então a
necessidade de capacitá-los. Assim a ONG MSF montou o curso de gestores, ampliando
as vagas para outras comunidades, implantando uma nova linha de ação:
desenvolvimento comunitário. Através desse projeto a organização, além de oferecer o
curso de capacitação, implanta o projeto junto com a comunidade, intermedia os primeiros
contatos com o poder público e prepara-os para se organizarem e seguirem com os
contatos. Após a conclusão desse processo ela se retira da participação direta.
O Projeto inicia-se em 1997 com apoio da União Européia e em parceria com as
Secretarias Municipais do RJ do Trabalho, da Saúde e de Habitação. O projeto chama-se
Capacitação de Gestores Comunitários - CGC I, com os seguintes objetivos:
è Definir uma metodologia de trabalho adequada
ao estabelecimento de uma discussão plural e participativa com equipamentos
comunitários regionais (governamentais e não governamentais), tornando-os
aptos para formular estratégias de mobilização e participação no interior de suas
próprias comunidades;
è Estimular a formulação de novas experiências
sociais nas comunidades de origem dos alunos;
è Fortalecer os movimentos comunitários locais
a partir de uma sólida capacitação política e administrativa;
è Sistematizar o debate acerca da
Participação/Organização Popular e do Desenvolvimento Comunitário.
O curso foi dividido em módulos: Redação e Expressão, Relações Humanas,
Contextualização Social e Política, Ética entre outros, com a participação de 54 alunos de
13 comunidades. O projeto tem continuidade no ano seguinte, com outras lideranças e
comunidades, é o CGC II, com os mesmos objetivos.
A partir deste curso surgiram alguns grupos organizados – Centro Integrado de
Ações Comunitárias (CIACOM), Núcleo Integrado de Ação e Desenvolvimento Social
(NIADS) ligado à Associação de Moradores do Dique, Centro Integrado de Ações doTelégrafos (CIATE), Movimento Organizado de Gestão Comunitária (MOGEC), Gestão
Comunitária de Marcílio Dias (CGMD), Coordenação de Projetos Sociais de Parada de
Lucas (CPS) e Agente Não Quer Só Remédio (AGNSR). Após a conclusão do curso estes
grupos organizados receberam um financiamento de micro fundo – Fundo de
Desenvolvimento de Ações Comunitárias (FUNDAC) e FUMPREP – Fundos de
Prevenção Popular para desenvolvimento de pequenos projetos sociais em suas
comunidades, sendo acompanhados até a finalização destes financiamentos.
Em 1999, a ONG Centro Integrado e Estudos e Programas de Desenvolvimento
Sustentáveis – CIEDS, que nasce já com a perspectiva de desenvolvimento comunitário,
assume o CGC III e implementa o CENAFOCO – Centro Nacional de Formação
comunitária, com objetivos idênticos. E ao final também teve como produto grupos
organizados, que contaram com assessoria da instituição. Entre estes – o Núcleo
Integrado de Apoio Sócio-Econômico a Comunidades de Baixa Renda (NAISEC) e o
Centro de Atendimento Comunitário União Social (CACUS).
É importante frisar que estas pessoas não foram escolhidas aleatoriamente, todas
tinham algum envolvimento com a comunidade, já desenvolvia alguma atividade, seja em
Associações de Moradores, seja em Igrejas ou desenvolvendo ações voluntárias sozinhas
como aulas de dança e de esporte. Assim “O primeiro contato com uma comunidade no
sentido da mobilização participativa se dá através de algum traço de identificação cultural,
pelo qual se sente tocada e atraída” (Demo, 2001, p.59).
É importante ressaltar que algumas pessoas não conseguiram concluir o curso,
alguns desistiram por problemas pessoais e sociais, como falta de recursos financeiros
para manter sua família, tendo que procurar emprego. Mas podemos considerar uma
iniciativa bem sucedida de Médicos Sem Fronteiras, porque teve a participação direta da
população envolvida. Pois:
A comunidade somente reconhecerá como seu aquele projeto que, mesmo tendo
vindo de fora, é capaz de revestir-se de traços culturais do grupo. É preciso
encontrar o eco reconhecido de algo que é seu, de algo que se encaixa na história
vivida, de algo que aparece nas determinações do dia-a-dia. (DEMO, 2001 p.
57-58)
3.2 – A formação do grupo e o perfil dos participantesEm 1999 alguns desses grupos formados e atuantes em suas comunidades
perceberam que sozinhos estava muito difícil de prosseguir com as ações, era necessário
se unirem para continuar. Então começaram a se reunir mensalmente e mobilizar outras
lideranças comunitárias, assim como outras organizações que atuavam na comunidade
ou para a comunidade, para juntos buscar novos projetos, parcerias, melhores condições
de vida para suas comunidades, dando o nome de Conselho de Gestores Comunitários
do RJ (CONGESCO-RJ), formando uma rede para dar voz e vez à comunidade, pois
“para uma comunidade ter voz e vez precisa organizar-se”. (Demo, 2001 p.72)
Um dos objetivos é eliminar os intermediários e fazer intercâmbio direto com o
poder público, podendo sugerir e interferir diretamente nos programas previstos para sua
comunidade e nas políticas públicas mais amplas, mostrando para o Estado quais são as
prioridades e não deixar que eles decidam pela comunidade:
Organizar-se para conquistar seu espaço, para gerir seu próprio destino, para ter
vez e voz, é o abecê da participação. Aí a negociação surge, não como boa
vontade ou concessão, mas como necessidade de sobrevivência. Somente então
haverá ‘vantagens comparativas’ ou cooperação horizontal, não ajudas, favores,
tutelas. (DEMO, 2001)
Uma ação que contribuiu para fortalecer a comunicação com a comunidade e com
o poder público foi o Fórum Local, onde autoridades governamentais são convidadas a
ouvir e a falar diretamente com a comunidade em reunião aberta a todos os moradores
para conversar diretamente com o Governo.
O CONGESCO busca fortalecer o trabalho comunitário, através da formação de
parcerias para trocas de experiências, organização de seminários e eventos para o
desenvolvimento comunitário, estimulando a elaboração de projetos em rede, realizando e
buscando oficinas de treinamento comunitário em diversas áreas, buscando intercâmbio
social e promovendo e socialização de informações, além de promover campanhas que
apóiem a inclusão social, a cidadania e a paz entre os diversos segmentos sociais que
atuam com comunidades em situação de pobreza.
Atuando nas favelas do RJ, os gestores não somente são testemunhas como
vivenciam e sofrem a realidade de extrema violência e exclusão social que predomina nas
comunidades. São moradores que não se contentaram em esperar por uma mudança,
vinda de fora para dentro, nem se lamentar ou se conformar. Dar visibilidade ao lado bomda favela, também é uma meta prevista, pois a realidade não é só pobreza e violência.
Existem ali laços de solidariedade que fazem de algumas favelas uma verdadeira
comunidade no sentido mais puro de comunhão e unidade. Enfim mostrar que os seus
moradores são tão cidadãos quanto os moradores do “asfalto”.
A idéia é que passem a agir, a exercer sua cidadania, exercendo seus direitos e deveres,
tal como descrita na Carta de Direitos da Organização das Nações Unidas (ONU), de
1948, onde a proposta principal é de que todos os homens são iguais ainda que perante a
lei, sem discriminação de raça, credo ou cor. De acordo com o conceito de cidadania
utilizado por Covre:
A todos cabem o domínio sobre seu corpo e sua vida, o acesso a um salário
condizente para promover a própria vida, o direito à educação, à saúde, à
habitação, ao lazer. E mais: é direito de todos poder expressar-se livremente,
militar em partidos políticos e sindicatos, fomentar movimentos sociais, lutar por
seus valores. (COVRE, 1999)
Exercendo seus direitos, entre eles o direito à participação. Seja em movimentos
sociais, políticos, fóruns, redes, conselhos etc., participando dos espaços públicos e
buscando conhecer mais sobre os programas sociais, de forma a participar desde o
planejamento até a implantação dos mesmos em suas comunidades.
Ainda falando em cidadania, para Covre não há mudança sem a ofensiva do
trabalhador-cidadão e cita o exemplo de exercício democrático dentro de uma fábrica, que
só é possível quando há organização coletiva, fazendo relação com outros movimentos:
Em movimentos sociais, essa mesma organização pode se dar num bairro, em
torno de reivindicações ligadas ao chamado salário social – saneamento, água,
luz, asfalto, creche etc. é com essas lutas, na fábrica, na rua ou na favela, que se
amplia a cidadania para a população carente. (COVRE, 1999)
Atualmente há cerca de 60 instituições comunitárias do estado do Rio de Janeiro
cadastradas, entre ongs, núcleos sociais, associações de moradores e associações de
mulheres, como: Centro Integrado de Ações Comunitárias (CIACOM) – Costa Barros,
Centro Integrado de Ação e Desenvolvimento Social (CIADS) – Jardim América, Centro
Integrado de Ações dos Telégrafos (CIATE) – Mangueira, Movimento Organizado de
Gestão Comunitária (MOGEC) – Vigário Geral, Coordenação de Projetos Sociais de
Parada de Lucas (CPS) – Parada de Lucas, Núcleo Integrado de Apoio Sócio-Econômicoa Comunidades de Baixa Renda (NAISEC) – Jacarezinho, Centro de Atendimento
Comunitário União Social (CACUS) – Jardim América, Grupo de Mulheres do Parque
Horácio – Benfica, Movimento de Rádios Comunitárias – Glória, Associação de Mulheres
de Edson Passos – Edson Passos/Mesquita, Pré-Vestibular Popular – Santa Tereza,
ABREVIA – Criança Esperança/Anchieta, Associação Sul-Americana dos Direitos da
Família (ASADIF) – Nilópolis, Núcleo Cultural Estação 22 – Realengo, Comunidades
Catalisadoras (COMCAT) – Centro, Associação de Mulheres do Arará – Benfica, Centro
Integrado de Apoio à Criança e Adolescente de Comunidade (CIACAC) – Parada de
Lucas, Associação Projeto Roda Viva – Tijuca, Fundação Dois Irmãos – Rocinha, Cen.
Consc. Social e Cultural Raízes Afro-brasileira – Paciência, Associação de Moradores do
Barro Vermelho – Santa Cruz, CENASC – Jardim Nova Era/Nova Iguaçu, Associação de
Mulheres de Madureira, Associação Comunitária de Gramacho, Associação de Mulheres
da Lagoinha – Nova Iguaçu, Los Angeles Atlético Clube – Padre Miguel, Grêmio Criança
Esperança – Anchieta, Centro de Educação Comunitária Tia Zilda – Morro da Lagartixa,
Associação de Moradores do Garibald – Duque de Caxias, Casa do Murillo – Morro dos
Prazeres/Santa Tereza, Profeto Filipenses M. Resultados – Belford Roxo, Centro de
Integração Social Amigos de Nova Era (CISANE) – Nova Iguaçu, Associação de
Moradores do Bairro Três Corações – Nova Iguaçu, Lixo.Con – Duque de Caxias, Cara
Brasil – Santa Tereza, Associação de Mulheres e Amigos de Cachoeirinha (AMAC) – Lins
etc.
O CONGESCO é formado por pessoas de comunidades de baixa renda, porém conta
com apoio de universidades, universitários e outras organizações não governamentais
que atuam na comunidade. É coordenada por uma Secretaria Executiva, atualmente
composta por duas instituições: o Centro Integrado de Ação e Desenvolvimento Social
(CIADS) e o Núcleo Integrado de Ações dos Telégrafos (CIATE).
O Centro Integrado de Ação e Desenvolvimento Social – CIADS é uma ong
“genuinamente comunitária” (nome atribuído pelos fundadores, por ser formada e gerida
por moradores de favelas), formada como núcleo social em 1996 e registrada em 2000,
por moradores de 3 favelas do subúrbio do Rio de Janeiro, com o objetivo de desenvolver
projetos e ações sociais que contribuíssem para a melhoria da qualidade de vida dos
moradores e suas comunidades. As ações sociais atendem desde crianças e
adolescentes a lideranças comunitárias de baixa renda. Tem se consolidado como uma
instituição de referência para ações em comunidades pobres, de alto risco social e difícil
acesso, principalmente nos grandes centros urbanos, sendo solicitada para consultoria,
palestras e cadeiras em conselhos e fóruns, através do trabalho de conscientização,mobilização e politização dos moradores das comunidades em situação de pobreza. Está
situada no bairro Jardim América, localizado na Região metropolitana do Rio de Janeiro,
um bairro tipicamente residencial, rodeado por 6 favelas planas, sendo que dentre essas
duas possuem menos de 3 anos de existência. Originária como núcleo social na favela do
Dique, sua sede está no bairro, pois o presidente da associação de moradores não
permitiu que continuasse dentro da comunidade, colocando a segurança dos membros
em risco. Hoje possui um espaço próprio dentro de uma das favelas mais novas do bairro
– Terra Encantada – nome escolhido pelas crianças do local.
O Centro Integrado de Ações dos Telégrafos – CIATE é um núcleo social localizado no
morro dos telégrafos, ponto mais alto do Complexo da Mangueira. Foi fundado em 1996
por um grupo de aproximadamente 10 voluntários, moradores locais. Desenvolve ações
sociais nas áreas de esporte, saúde e educação em parceria com a Vila Olímpica da
Mangueira, a FAETEC, a Associação de Moradores, Associação de Mulheres e outras
instituições internas e externas.
Segundo cadastro de filiação ao CONGESCO-RJ, a maioria dos 90 participantes, cerca
de 90%, é natural do Rio de Janeiro, a maioria são moradores da capital do Rio de
Janeiro, sendo que também possui moradores da Baixada Fluminense, Duque de Caxias,
Nilópolis, Mesquita e Nova Iguaçu, com escolaridade entre fundamental e médio, apenas
2% de nível superior, na faixa etária entre 30 e 50 anos e média de 10 anos de trabalho
comunitário, sem emprego fixo, dedicando-se integralmente a instituição; recebendo
apenas ajuda de custo de projetos, já que são parte da diretoria e não podem receber
salários pela instituição; ou ainda fazem “bicos”.
3.3 – Principais Conquistas e Limites
O grupo se reúne uma vez por mês, uma reunião ampliada, ou seja, qualquer pessoa
pode participar. No ano de 2006 o CONGESCO-RJ completa 10 anos e alguns resultados
dessa rede foram a participação social e política na forma de Seminários, Oficinas,
Conselhos, Congressos e Fórum Social Mundial e Brasileiro. A atuação do grupo chamou
a atenção do cineasta e professor doutor da Escola de Comunicação da UFRJ, Fernando
Salis, que filmou 2 filmes documentários, através de projeto Vídeo Social. O primeiro
chama-se “A Voz da Ponta: A favela vai ao Fórum Social Mundial”, gravado antes durante
e depois do Fórum Social Mundial de Porto Alegre em 1993, onde na ocasião o grupo
conheceu um movimento de base comunitária de Nova Iorque, o Community Voices Hard
(CVH) e começou um intercâmbio, através de salas de bate-papo, que gerou dois
encontros entre os membros – um em Nova Iorque, onde foram dois membros do
CONGESCO e outro no Rio de Janeiro onde vieram 04 membros de CVH, fornecendo
material para o 2º documentário “Nós em Rede”. O filme retrata esses encontros e a troca
feita entre os grupos. Dessa parceria com o Vídeo Social, nasceu a proposta de uma
pesquisa sobre a principal ação destes gestores – Bancos de Preservativos (local dentroda comunidade que distribui mensalmente preservativos e material informativo – insumos
repassados pela Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro – aos moradores, mediante
cadastro). Essas ações são desenvolvidas desde 1996, por moradores participantes dos
projetos de Capacitação de Gestores Comunitários. A pesquisa está em desenvolvimento
desde fevereiro deste ano e um dos objetivos é traçar um perfil dos agentes comunitários,
dos usuários e dos bancos.
Têm sido protagonistas dentro de suas comunidades na luta por melhorias, não somente
com projetos e ações sociais, mas buscando o poder público para o debate, através de
suas reuniões mensais e de Fóruns Comunitários – um espaço aberto na comunidade,
onde se encontram lideranças, a comunidade e o poder público e são levantadas as
principais necessidades e encaminhadas propostas.
Todos participam de mais de um espaço de mobilização, alguns atuam em Conselhos
Distritais e Municipais de Saúde, Conselho Municipal de Assistência Social, Fórum de
ONG/AIDS do RJ.
O principal limite que tem se colocado para esse grupo é a falta de recursos financeiros
para participar das reuniões e articular ações conjuntas, assim como continuar
participando de Congressos, Conferências e Seminários e outros encontros necessários
para estar no debate, exercendo assim o controle social. Pois sem conhecimento
sabemos que é impossível concordar, discordar e propor ações, e muitas fezes lhes
faltam o básico: o dinheiro para locomoção até esses espaços de participação. A ausência
de recursos financeiros é responsável por uma atuação mais fraca. Alguns grupos ou
pessoas chegam a se afastarem ou mesmo desistir da “militância”.
Como foi visto anteriormente, já a partir da década de 70, em plena ditadura militar e
reorganização dos movimentos sociais, percebeu-se a importância de lutas nos espaços
de moradia. Foi quando se fortaleceram as associações de moradores (como a FAMERJ)
que contaram com a:
Ação de organizações e militantes de esquerda que procuravam contribuir no
processo de redemocratização da sociedade através da construção de
organizações permanentes da população urbana no local de moradia que, ao lado
da organização no local de trabalho, pudesse permitir o alcance de
transformações mais profundas na sociedade. (PORTO, 1995)
No começo essas lideranças tinham a vontade de mudar o mundo como fala um
deles em entrevista ao Jornal Nacional:
“No começo eu achava que eu podia mudar o mundo, depois achei que eu poderia mudar a cidade,
depois eu achei que podia mudar a comunidade. Hoje se eu conseguir conscientizar pelo menos as
pessoas que estão em volta de mim, eu acho que vai ser uma grande coisa” (Ângelo Silva, em
entrevista ao Jornal Nacional, 2005)
Conforme a participação política, a visão foi se ampliando e hoje o grupo tem a consciênciade que não é possível mudar o mundo, mas pode-se mudar parte dele, começando por seus
familiares, amigos e vizinhos.
O CONGESCO-RJ é a-partidário, não religioso, não institucionalizado. Que atua do
reforço escolar à alfabetização da terceira idade, do futebol para crianças às artes para
todas as idades, da reciclagem do lixo às campanhas de prevenção à DST/AIDS. Esses
gestores trabalham em conjunto para construir comunidades solidárias em que a falta de
recursos e apoio do Estado e de outros setores da sociedade não seja um impedimento
para a realização plena de suas atividades.
NOTAS F




terça-feira, 12 de junho de 2012


12 de junho  Dia Mundial, Nacional de Combate ao Trabalho Infantil.
É considerado trabalho infantil toda e qualquer atividade econômica ou de sobrevivência, com ou sem finalidade de lucro, remunerada ou não, realizada por crianças ou adolescentes com idade inferior a 16 anos, exceto na condição de APRENDIZ a partir dos 14 anos, independentemente de sua condição ocupacional.
O trabalho que precisa ser erradicado é aquele que:
- Explora a criança ao invés de empregar os pais;
- Escraviza e explora sexualmente;
- Compromete o desenvolvimento físico, social, moral, emocional e cognitivo;
- Cria situações de risco pessoal e social para crianças e adolescentes;
- Retira precocemente a criança dos seus espaços pedagógicos mais legítimos;
- Dificulta a permanência da criança na escola;
- Constitui desrespeito, violação ou negação dos direitos garantidos pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e pela Convenção Internacional dos Direitos da Criança.